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Quanto aos romances de Machado de Assis, sabe-se, ou presume-se, que seus narradores são homens brancos, proprietários de bens imóveis e semoventes, que se imaginam controladores de uma vasta economia de favores. Grandes senhores da Corte, esses autores ficcionais seguem etiqueta e protocolo narrativos condizentes com a maneira como representam o seu mundo. Quanto à escravidão, predomina o laconismo ou o silêncio, cujo motivo é em parte incerto: por um lado, a escravidão era instituição tão naturalizada, que sequer ocorre a tais narradores registrar a presença dela nas histórias que contam; por outro lado, a politização do tema a partir de meados do século XIX torna de mau gosto a menção a fato que escancarava a contradição entre o verniz de civilização desejado e a realidade da violência no trabalho. Em Helena, só um escravizado tem nome, Vicente, que servia ao conselheiro Vale e em seguida a Helena, porém em várias passagens do romance se faz menção à legião de escravizados no interior da residência ou a viver na senzala da chácara da família. O conselheiro Vale morreu em abril de 1850. Em maio de 1850 morreu Bernardo Pereira de Vasconcelos, político conservador, defensor do tráfico africano. Anos depois, vários de seus escravizados entraram na justiça contra a herdeira de Vasconcelos, argumentando que ela lhes mantinha ilegalmente na escravidão. As ações de liberdade sobre o caso permitem acesso fascinante ao mundo do trabalho numa grande propriedade urbana da Corte, mundo que os narradores de Machado não descrevem nem ostentam.